segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Aula de Lúcia Santaella http://youtu.be/xPJ0QC6k4u8


ASSUNTO: A aula aborda a Tríade Peirceana: objeto, signo e interpretante; tipos de objeto (imediato e dinâmico), tipos de interpretante (imediato e dinâmico), suas definições, tipos, exemplificações e aplicações.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

SOBRE TEOLOGIA E A ARTE DE DAR NOME ÀS COISAS


por Jonathan MenezesSeg, 22 de Novembro de 2010 10:21 

O ser humano moderno foi acusado pelos seus opositores, os pós-modernos, de naturalizar o conhecimento, isto é, de tentar dar ao conhecimento o caráter de algo que sempre aí esteve, à disposição, para ser descoberto por meio do estudo dos objetos. O conhecimento, nesse sentido, seria algo dado, um produto pronto, prévio e independente da ação e intervenção humanas, cuja parte seria apenas a de apreensão e representação ou re-apresentação desse conhecimento. Os conceitos nasceram para dar conta do mundo, para ser uma designação fiel das coisas às quais eles remetem. Se digo, por exemplo, “Deus”, o dizer em si já remete à entidade a qual desejo designar. Parte-se do pressuposto da correspondência entre a palavra e a coisa em si.
Não foram só os pós-modernos que denunciaram a ilusão dessas pretensões modernas. Vozes solitárias no século XIX como a de Nietzsche, contribuíram para o questionamento das bases dessa quimera. Em um texto seminal, de 1873, intitulado “Verdade e mentira no sentido extramoral”, esse filósofo lança mão de aporias do tipo: por que razão o mundo se mostraria como ele é? Seria a linguagem um simples espelho da realidade? Assim, a partir de uma fábula possível, ele propõe a tese de que o conhecimento humano é relativo e que, portanto, é arrogante e ilusória a pretensão dos filósofos – teólogos, no caso aqui proposto – de querer “dar conta” da realidade a qual se referem.

Nietzsche parte da tese de que o conhecimento foi inventado. Isso na primeira frase do texto: “Em algum remoto rincão do universo cintilante que se derrama em um sem-número de sistemas solares, havia uma vez um astro, em que os animas inteligentes inventaram o conhecimento”.[1] Na percepção de Michel Foucault[2], quando Nietzsche usa a palavra “invenção” tem sempre em mente uma palavra que se opõe à “invenção” – e que, diga-se de passagem, foi por muito tempo cara aos teólogos – que é a palavra “origem”. Quando ele fala que o conhecimento foi inventado, significa, portanto, que o conhecimento não tem uma origem, isto é, não existia antes de ser inventado, não é “dado” pelo universo.

Foucault usa um exemplo da análise desse filósofo, que é o da religião. Nietzsche critica seu mestre, Schopenhauer, que em sua visão cometeu o erro de buscar a “origem” da religião em um sentimento metafísico – como também fizera Friedrich Schleiermacher, para quem “religião é sentimento” – “que estaria presente em todos os homens e conteria, por antecipação, o núcleo de toda religião, seu modelo ao mesmo tempo verdadeiro e essencial”. O protesto de Nietzsche, nas palavras de Foucault, é que essa é uma análise da história da religião “totalmente falsa, pois admitir que a religião tenha origem em um sentimento metafísico significa, pura e simplesmente, que a religião já estava dada, ao menos em estado implícito, envolta nesse sentimento metafísico”.[3] Em outras palavras, as religiões, assim como a cultura e a história, não são dadas, são fabricadas. Parafraseando Nietzsche, são fabricações da linguagem.

Com isso, parte-se de dois princípios: 1) somos irremediavelmente ligados à atividade de nomear; 2) “nomear é dar forma ao mundo”, pelo menos à parcela do mundo cabível à nossa compreensão e explicitada pela linguagem. Nomear não é nem representar, nem dar conta do mundo. Nomear é criar. Logo, o conhecimento – não um dado, mas uma produção – é apenas uma visão parcial do objeto conhecido. A linguagem conceitual não é uma tradução, mas uma invenção. Não há afinidade entre o conhecimento e seu objeto. Dizer “isso é fé”, não significa dar conta da coisa em si, fé. Mas essa é uma condição indissociável do conceito, que segundo Nietzsche nasce por “igualação do não igual”. Assim, todo conhecimento é uma violação de seu objeto...


Encerrei a primeira reflexão dessa série falando sobre nossa irremediável condicionalidade à linguagem e à arte (no sentido de criação e invenção aplicado por Nietzsche) de nomear as coisas. É preciso retornar a isto para dar contorno à segunda linha de argumentação que aqui desejo propor, que na verdade se expressa em continuidade com a anterior. Na primeira parte de A gaia ciência Nietzsche faz uma menção mais direta desse problema da linguagem quando afirma que para nós mais importa saber como se chamam as coisas do que o que elas são. Penso que exatamente por não sabermos o que as coisas são em sua essência é que nos aferramos na atividade de nomear, de dizer “isto é assim”, “aquilo é assado”. Mas, pergunto: quem está livre de tal condicionalidade? Com isso, Nietzsche denuncia o abismo existente entre nós e o mundo tido como essencial. Nossa relação com ele não é mediada pela correspondência, e sim pela criação: “Só os criadores podem destruir! Mas não esqueçamos isto: basta criar novos nomes, apreciações, novas verossimilhanças para criar, com o tempo, novas coisas”.

Parto, porém, do pressuposto de que vivemos (nós, teólogos, mais intensamente) pautados pela negação de que somos criadores, pois tal negação nos permitiria sobreviver na ilusão “necessária” de que aquilo que produzimos discursivamente, os significados que damos ao mundo, correspondem à verdade. Essa é, aliás, a ilusão do fundamentalismo. Tal ilusão é nosso escudo de proteção contra a conflitividade gerada pela consciência de que não lançamos mão de verdades e sim de interpretações, o que automaticamente desautorizaria, nosso discurso perante um rebanho, uma coletividade. É preciso, portanto, manter os signos e os códigos combinados, a fim de que continuemos não só protegidos pela “nossa verdade”, mas pela crença coletiva na identidade. E só permanecemos nessa crença, diz Nietzsche, graças à nossa capacidade de esquecer. Como analisa Viviane Mosé, “sem esquecer a pluralidade sensível que gerou a palavra, o homem não teria chegado a concluir que a identidade forjada pelas palavras pudesse corresponder efetivamente às coisas”.[4]

Em uma palestra ministrada semana passada na Universidade Estadual de Londrina, Mosé afirmou que a palavra não passa de uma “moldura vazia”; e, à medida que é lançada, cada um faz o que quer com ela, isto é, preenche-se tal moldura como se acha mais conveniente ou apropriado para aquele momento. Se estendermos tal metáfora à comunicação, perceberemos que a comunicação, que desejamos ser uma possibilidade (de entendimento e correspondência de pensamento entre duas ou mais pessoas), é, na realidade, cheia de fissuras e impossibilidades. Como já diriam os estudiosos em comunicação, mas sem muito aprofundamento, a comunicação, ou mais precisamente a “fala”, é cheia de “ruídos”. O problema surge quando, ou como quase sempre acontece, nos esquecemos de que tendemos a reter muito mais os ruídos do que propriamente a intenção original de um sujeito no ato de dizer ou significar algo. Assim, nossas significações das coisas (atos de fala) são produtos criativos de outras significações. Tudo passa, até nós mesmos, pelo filtro da linguagem.

Por fim, vale ressaltar outra questão que me chama atenção na fala de Viviane Mosé, ao apontar para nossa interpretação do mundo, que segundo ela é baseada na fragmentação, numa racionalidade que origina um pensamento pautado por julgamentos, divisões, descrições, mas que, em virtude da ilusão em torno da qual gravitam, pretendem atingir a totalidade. Ao pretender atingi-la irremediavelmente se exclui a pluralidade de possibilidades que envolvem a compreensão de uma coisa. Ao excluir a pluralidade, exclui-se a diferença. Nossa visão míope, mas pretensamente totalitária, nos conduz à exclusão, ao afastamento da diferença. Isso me dá pelo menos uma pista importante para entender as razões que nos mantêm no campo da intolerância (de múltiplas naturezas) num mundo cada vez mais plural; ela está no princípio de nossa forma de conhecer, de nossa aversão às diferenças, de nosso fundamentalismo oculto ou sofisticado.


De que maneira relaciono essa reflexão sobre “dar nome às coisas” à teologia? Para finalizar essa série e responder a tal questão quero aqui me valer da discussão feita por Jacques Ellul em seu livro A palavra humilhada. Certa vez, ouvi de um professor o seguinte: “Para tudo o que é, a linguagem cala”. E logo me lembrei da passagem bíblica em que Moisés pede uma alcunha para Deus, como se dissesse: “Esse povo aí irá me perguntar a Quem estou dizendo para eles seguirem; embora eu tenha dito que é ‘o Deus de vossos pais’, eles vão querer um nome; então que nome eu dou pra você, quem é você afinal?”. E a resposta do Senhor foi emblemática: “EU SOU O QUE SOU”. E para tudo que é... Se a discussão é sobre se ele é verdadeiro ou não, a resposta é: “EU SOU”. Pronto. Contente-se com isso, Moisés, com a impossibilidade de expressar a verdade por meio da sua linguagem. Como diz Ellul, “se a verdade é a verdade acima de nossas apreensões e estimativas, ela é. Ponto final. Permanece, forçosamente, ela mesma”. Logo, completa ele, “a verdade nada mais é do que o absoluto ou o eterno, e de cujas margens não somos sequer capazes de nos aproximar”.[5]

Certo então, a linguagem se cala diante da verdade, pois dizer a verdade compreensivamente (em tudo o que ela é) seria o mesmo que matar a própria verdade. Entretanto, como até aqui temos visto, o ser humano se serve o tempo todo desse meio improvável chamado de linguagem, de modo que se poderia indagar: “Ora, se somos irremediavelmente ligados a essa atividade de nomear, como posso me calar diante de tudo aquilo que vejo”? Eis a questão, difícil aporia, nós somos “incaláveis”, se me permitem o neologismo. De tal modo que a relação e ansiosa busca pela verdade estão intimamente associadas com a fala. A verdade (ou, a verdade para mim) é... Assim, a verdade torna-se sinônimo do verbo, idêntica à palavra, efêmera e fugaz, ao que é dito, “igualação do não igual”. Trata-se, como diria Ellul, de nosso instrumento mais lábil, incerto, referindo-se ao que é mais certo. “Eu sou o caminho, a verdade e a vida”. Mas como saberemos o caminho? O que é a verdade? Que vida é essa? Continuamos tentando descodificar a verdade na linguagem.

Nossa referência ao real está sempre em busca de correto e incorreto. Fazer teologia, até aqui, tem sido julgamento do correto pelo incorreto. Embora a verdade que desejamos tanto deter, nos escapa, porque somos detidos por ela e não o contrário, ainda assim insistimos em nos mover num universo de exatidão, em busca da única resposta, a solução correta, o paradigma exato. Quando, na natureza do paradigma em si mesmo, mora a imprecisão. Como diz Ellul: “Não existe experiência imediata da verdade, nem da mentira, nem do erro. (...) O que vem da palavra nunca é evidente. O real pode ser evidente, a verdade, nunca”.[6] Um leitor um pouco mais impaciente que o resto, poderia perguntar: “Mas então porque devo continuar nisso se já descobri que a verdade não pode ser descoberta”?

É simples, e é complexo: porque é ela que confere sentido ao nosso existir. A impossibilidade da linguagem deveria, assim, nos conduzir a uma tarefa mais honesta, humilde, dependente daquilo que somos e temos, e da graça de Deus e, por tudo isso, alegre e celebrativa. Eis o extraordinário, diria Ellul: é uma benção para o ser humano viver assim, cativo da linguagem, distante da completude e, ao mesmo tempo, em busca dela, pois do contrário, acrescentaria eu, não seriamos seres humanos e sim deuses, ou semideuses. Parafraseando Ellul, nossas certezas teológicas podem ser falsas quanto à exatidão da revelação (quando assim pretendemos), mas são elas que nos permitem viver. O maior milagre e a maior benção da teologia, bem como da vida humana, é também sua maior limitação: não em expressar a verdade (quanto mais a divina) por vias exatas, mas em encontrar fragmentos dessa verdade na inexatidão da linguagem. “Assim se situa esta vida maravilhosamente humana. O sentido mais garantido dirigindo-se ao mundo mais incerto. O sentido mais frágil, exprimindo o indiscutível”.[7]

[1] NIETZSCHE, Friedrich W. Sobre verdade e mentira no sentido extramoral. In: Coleção Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1999, p. 53.

[2] FOUCAULT, Michel. A verdade e as formas jurídicas. Rio de Janeiro: Naw, 2002, p. 14.

[3] Ibid., p. 15.

[4] MOSÉ, Viviane. Nietzsche e a grande política da linguagem. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005, p. 73.

[5] ELLUL, Jacques. A palavra humilhada. São Paulo: Paulinas, 1984, p. 35.

[6] Ibidem.

[7] Ibid., p. 43.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Homossexualidade, preconceito e intolerância: análise semiótica de depoimentos

O título acima se refere à  tese  sobre o preconceito e intolerância contra a homossexualidade, a partir da análise semiótica de depoimentos de mães heterossexuais e de filhos homossexuais, brasileiros. 


O trabalho divide-se em introdução, quatro capítulos principais, conclusão, bibliografia e anexos. Na introdução, delineou-se o contexto externo em que se desenvolve a dificuldade de aceitação das mães heterossexuais a seus filhos homossexuais e um apanhado geral do trabalho. 


O contexto interno foi considerado como o resultado do cruzamento comparativo de centenas de depoimentos analisados, de mães e filhos. Utilizou-se, como embasamento teórico, a semiótica de tradição francesa e seu instrumental de análise e a tese divide-se como segue: 




  1. O primeiro capítulo traz a metodologia que foi utilizada e os objetivos do trabalho. O principal objetivo foi analisar como são construídos os discursos de rejeição e/ou os discursos de aceitação da homossexualidade de filhos por suas mães, heterossexuais. Em contrapartida, foram analisados os discursos dos filhos.
  2. O segundo capítulo tratou do preconceito, de mães e dos filhos, anterior à descoberta da homossexualidade. 
  3. No terceiro e quarto capítulos da tese, relacionou-se o percurso discursivo passional de rejeição/aceitação das mães à sua influência no percurso passional de autoaceitação dos filhos e levantou-se os principais tipos de paixões e ações apaixonadas que esses discursos manifestam. 

Examinou-se também a organização discursivo-passional e da enunciação de milhares de depoimentos, relacionando texto e contexto via enunciação. A partir disso, foi feito o levantamento de semelhanças e diferenças qualitativas, entre os percursos de aceitação das mães a seus filhos homossexuais, na última década (2001 a 2010).
Tese integral aqui

domingo, 9 de outubro de 2011

As notícias: abordagem semiológica. Do signo ao discurso


2.8 As notícias: abordagem semiológica. Do signo ao  discurso

Não é exagerado dizer que a semiologia e a semiótica impulsionaram os primeiros estudos sobre a linguagem do jornalismo. Fundando-se na intuição originária saussuriana da arbitrariedade do signo, muitos académicos desenvolveram uma análise mais ou menos exaustiva dos sistemas de signos postos em jogo na linguagem jornalística.

A relevância da semiologia para o jornalismo tornou-se manifesta logo que Roland Barthes lançou uma crítica ideológica da linguagem da cultura de massa (Mythologies, 1957), e fez a primeira desmontagem semiológica da linguagem, determinante para os estudos que viriam depois: a linguagem dos media franceses durante a guerra da Argélia tornou-se uma espécie de impulso inovador para as práticas de descodificação que vieram a ser praticadas no âmbito destes estudos.

A concepção da linguagem como sistema de signos convencionais e arbitrários (Barthes, 1989, pp. 11-12; Saussure, 1978: pp. 40-41) permitiu uma compreensão diversa do papel da linguagem na estruturação de relações sociais. Gerou percursos diversos no âmbito da análise da notícia, mas que convergiram em torno da sua importância simbólica, discursiva e narrativa. Alguns trabalhos de semiótica e de semiologia influenciados por Barthes embora com certa atenção às dinâmicas sociais vêm de autores que geralmente se filiam na corrente dos estudos culturais.

A semiologia foi directamente inspiradora dos trabalhos do Centro de Estudos Culturais de Birminghan que na colectânea Culture, media and language (Hall, Lowe ,Hobson e Willis, 1980) desenvolveram intuições de origem semiológica para a análise do posicionamento ideológico dos media. Em “Ecoding /Decoding”(2002), através de categorias da semiologia articuladas a uma noção marxista de ideologia, Hall insiste na pluralidade das modalidades de recepção dos programas televisivos.

Argumenta, também, que podem ser identificadas três posições hipotéticas de interpretação da mensagem televisiva: uma posição “dominante” ou “preferencial” quando o sentido da mensagem é descodificado segundo as referências da sua construção; uma posição “negociada” quando o sentido da mensagem entra “em negociação” com as condições particulares dos receptores; e uma posição de “oposição” quando o receptor entende a proposta dominante da mensagem mas a interpreta segundo uma estrutura de referência alternativa.

Na verdade, os estudos sobre a linguagem foram largamente marcados por uma convergência entre um crescente interesse na ideologia (Hall, 1977; Glasgow University Media Group, 1976), estimulado pela influência de certos autores marxistas como Gramsci bem como pela redescoberta da problematização da linguagem pela semiologia francesa (Barthes) e pela escola culturalista britânica (Hall et al., 1993) (ver a propósito Traquina, 2000, p.18).

Dois dos trabalhos mais importantes neste domínio foram Reading Television de John Fiske e James Hartley e Understanding the News de James Hartley. Hartley, nomeadamente, parte da ideia estruturalista segundo a qual um sistema é uma estrutura de elementos relacionados entre si de acordo com determinadas regras. Para o entender, é necessário distinguir os diferentes elementos uns dos outros, e demonstrar como é  que eles são seleccionados e combinados de acordo com as regas e convenções que lhe são apropriadas.

Aceitando a premissa que o valor dos signos é determinado pela sua relação com outros signos no interior do sistema, a selecção de cada palavra não é determinada pela natureza do referente mas por um processo de selecção e combinação estruturalmente regulado (Hartley, 1991, pp. 15-16).
É impossível falar das notícias como um sistema sígnico autónomo das convenções e características da linguagem (. . . ) Não é o acontecimento que é relatado que determina a forma, conteúdo, significado ou a «verdade» das notícias, mas são antes as notícias que determinam o que é que o evento significa. (Hartley, 1991, p. 15)

Hartley distingue entre sistemas de linguagem e discursos, distinguindo os segundos como diferentes formas de uso tornadas possíveis pela linguagem. O discurso implica o encontro entre sistemas de linguagem e as condições sociais: a sua compreensão exige uma atenção mais próxima às circunstâncias históricas, sociais e culturais da sua produção e consumo. Estudar um discurso específico implica atender à sua função social (Hartley, 1991, p. 6).

Apesar da importância conferida à linguagem como sistema, importa estudar os constrangimentos na análise das notícias como discurso e consequentemente o contexto em que estas funcionam: “As notícias são uma instituição social e um discurso cultural que só existe e ganha significado em relação com outros discursos e significados que operam ao mesmo tempo” (Hartley, 1991, pp. 8-9). A ideia é que os signos não expressam apenas relações entre si nem com o referente mas entre o enunciador e enunciatário (Hartley, 1991, pp. 22; 25).

Por isso, qualquer verdadeira interpretação é dialógica por natureza (Hartley, 1991, p. 26). Na actividade quotidiana de produção noticiosa, a potencial abertura dos significados é objecto de um processo de uniformização do significado em detrimento da pluralidade significativa verificando-se, por vezes, a imposição de um processo de “leitura preferencial” (Hartley, 1991, p. 63).

Os signos são condicionados pela forma de organização social em que os participantes se envolvem mas também pelas condições imediatas da sua produção. Estas, na perspectiva de Hartley, implicam a atenção à estrutura social de classes e às relações de poder e de dominação que lhe são inerentes. A vida dos signos nesta lógica é também um campo de confronto social e ideológico (Hartley, 1991, p. 74). “Podemos perceber como é que as notícias funcionam, que interesses servem, podemos recorrer a esta compreensão cada vez que vemos ou ouvimos notícias” (Hartley, 1991, p. 9).


Fonte: CORREIA, João Carlos. O admirável Mundo das Notícias - Teorias e Métodos. Portugal: Labcom, 2011. Disponível em http://www.livroslabcom.ubi.pt/pdfs/20110524-correia_manual_noticial.pdf acessado em 24 mai 2011

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